quinta-feira, 30 de novembro de 2023

A Cronica de Walmir Rosário

 

A CORRIDA ENTRE O CACAU DA BAHIA E DA AMAZÔNIA

O cacau, da amêndoa ao chocolate
 - Foto Águido Ferreira  - Ceplac

Por Walmir Rosário*

Por muitos e longos anos o cacau produzido na Amazônia era visto como de qualidade inferior. E realmente foi. Mas essa realidade faz parte do passado e a cada dia a lavoura cacaueira amazonense nos surpreende, principalmente nos estados do Pará e Rondônia. E o chocolate produzido lá pelas bandas do norte brasileiro vem ganhando prêmios e mais prêmios nos eventos internacionais.

E essa mudança não surpreende os que veem a cacauicultura brasileira com um olho no padre e outro na missa, como se diz. É verdade que ainda existe aquele cacau nativo e de qualidade inferior, cercado de vassoura de bruxa por todos os lados, mas estamos falando das novas plantações, incentivadas pela Ceplac e tão combatida pelos cacauicultores do Sul da Bahia.

Pra começo de conversa, o pé de cacau plantado na ponta do facão hoje só pode ser visto nos livros do conterrâneo Jorge Amado e essa nova cultura é cercada de conhecimento científico. A genética foi revirada pelo avesso, a clonagem é o assunto do momento, a produtividade é a marca a ser batida. Porém, a qualidade do produto final, o chocolate, é a galinha dos ovos de ouro dos bons produtores.

Quem é do negócio chocolate não se surpreendeu quando a revista Forbes estampou que Rondônia produz o melhor e mais espetacular cacau especial do Brasil. E o anúncio foi feito justamente em Ilhéus, por ocasião do Concurso Nacional de Cacau Especial do Brasil – Sustentabilidade e Qualidade, nesta sexta-feira (24). Na terra do maior concorrente.

Um dos prêmios foi concedido ao produtor Robson Tomaz de Castro Calandrelli, do sítio Três Irmãos, no município de Nova União, em Rondônia, vencedor na categoria mistura. Já na categoria varietal (única variedade genética de cacau), o vencedor foi Deoclides Pires da Silva, da Chácara Tiengo, em Jaru, em Rondônia, cuja lavoura foi implantada pelos seus pais em 1970.

Outros produtores de Rondônia e do Pará também foram premiados. Da Bahia, especificamente, Ilhéus, subiu ao pódio, como disse a Forbes, a produtora Marina Paraíso. Ao que parece, na cacauicultura, o sol já nasce para todos, desde que o produtor busque o seu lugar com os conhecimentos científicos disponíveis e os que ainda estão por vir.

Não encaro esse concurso como uma derrota dos cacauicultores baianos, mas como um alerta de que não basta cair, anualmente, cerca de mil e quinhentos milímetros de chuvas bem distribuídas; a sombra da Mata Atlântica; os solos excepcionais do Sul da Bahia; a melhor fermentação e os notáveis barcaceiros. Há anos o cacau está sendo produzido a pleno sol, com irrigação e o conhecimento dos produtores do cerrado, tudo isso sem os inimigos naturais.

Além da pretendida alta produtividade, como chegar a mil arrobas por hectare, é preciso que o cacauicultor tenha em vista produzir cacau de qualidade, como muitos vêm fazendo com “os cacaus finos” no Sul da Bahia. Para o cacauicultor, a premiação não é um afago ao ego, mas o consequente sobrepreço no seu produto, em amêndoas ou em chocolate pronto. Mais dinheiro no bolso.

Por se tratar a cacauicultura iniciativa privada, sem gozar das antigos benesses dos subsídios governamentais, poderemos assistir a uma disputa mais acirrada no próximo ano. E garanto que será páreo cada vez mais duríssimo com a entrada do cacau do cerrado. Essa competição nos mostra, ainda, a especialização dos produtores de cacau in natura (amêndoas) e em produto final, o chocolate.

Não poderia deixar de dar um testemunho sobre a melhoria da qualidade da cacauicultura da Amazônia, desde os anos 1990, quando assistimos aos mais diversos experimentos. E eles sempre visavam um produto de qualidade e mais dinheiro na sua conta bancária, a exemplo do sombreamento de cacaueiros com mogno e outras espécies de madeira de lei. Um consórcio que unia o útil ao agradável.

E registramos esse incremento da cacauicultura nos estados de Rondônia e no Pará, especialmente às margens da rodovia Transamazônica, locais que estão recebendo os “louros” pelo excelente tipo de investimento e administração. E mais, os cacauicultores da Amazônia, de cerca de 40 anos pra cá, somente foram conhecer o cacau assim que chegaram do sul do país à Amazônia.

Lembro-me, que nesta época, os bancos do Sul da Bahia queriam distância dos produtores de cacau, enquanto os da Amazônia visitavam os cacauicultores com tentadoras propostas de financiamento à lavoura. As agências bancárias disputavam as exposições da Ceplac como forma de atrair os agricultores, o que chamou a nossa atenção (eu, que editava a revista “Ceplac, um bom caminho”, o jornalista Odilon Pinto, e o fotógrafo Águido Ferreira).

O certo é que os tempos mudaram e a cacauicultura não sobrevive mais do choro por preços melhores nos mercados interno e internacional, tampouco de financiamentos subsidiados e dívidas perdoadas. A realidade atual é oferecer ao exigente mercado cacau em amêndoas e/ou chocolate, de qualidade superior. Quem oferece o melhor produto recebe, em troca, preços especiais.

São as leis do mercado.

*Radialista, jornalista e advogado

domingo, 26 de novembro de 2023

apoesiadominical

As cores da minha Alma 


Não quero que a minha alma me dê adeus

Enquanto eu estiver dormindo.

Não quero que o meu coração pare de bater quando

Você estiver ausente.

Não quero perecer sem as estrelas, não

Acompanhar As cores do meu corpo

Que se ausenta, mergulhando na

Escuridão da tumba que serei enclausurado,

Em busca das promessas Divinas,

De um dia acordar.

Não quero perecer dormindo, sem antes

Ver os seus olhos fitando os meus,

Num Adeus final.

Quero perecer entre madrugadas insones

Entrelaçando as suas mãos em forma de

Oração matinal.

Quero perecer antes das suas lágrimas que

Não deverão molhar o seu rosto por mim.

Que venha o Réquiem dos Arcanjos e aquela música

Que me acalentou nos cabarés, antes

De o garçom servir as últimas doses que

Beberei ouvindo os sinos dobrarem! Por quem?

 

Ah, insensatez

Ah, insensatez que afloram na minha pele,

Quando tenho medo de te amar.

Ah, insensatez que nasce nos meus olhos,

Quando já não sou ouro ou madeira, pérola de ostras talvez,

Não valiosa quanto às íris dos seus olhos, porque eu não sei.

Ah, insensatez que não me alimenta das sensações,

Nas correntezas cardíacas, similares que pulsam no meu

Peito nu.

Ah, insensatez das promessas que fiz recíprocas talvez.

Ah, insensatez que brotam como beijos roubados,

Batalhas vencidas e amores insensatos que ainda me deixa

Sonhar com o Eu te Amo.

Ah, insensata cheia de memórias que atravessa-me

Nas escuridões, nos breus, ou no sangue coagulado

que escorre em minhas veias, não como prantos, mas como

imberbes promessas, que mata a insensatez que mora em mim.

Insensatez! Ah, loucuras que agora devoro, entre as distâncias

e os acalantos que cantastes pra mim.

 

quinta-feira, 23 de novembro de 2023

O ESPORTE BRETÃO – DE TABOCAS A ITABUNA

 

O ESPORTE BRETÃO – DE TABOCAS A ITABUNA

 

Sport Club Foot-Ball Brazil: Silvino Pires, Liano
Mota, Antônio Costa, Gustavo Almeida, Manoel
Almeida, Antídio Moraes, Francisco Barbosa,
Francisco Menezes e Antônio Menezes. (1912)

Por Walmir Rosário*

Não é de hoje que o futebol faz parte da vida do itabunense. Por essas bandas o esporte bretão já campeava desde os tempos em que Itabuna ainda era distrito de Ilhéus, conhecida como Tabocas. Jogadores não faltavam para as exibições nas tardes de domingo, com o que tinha de melhor na sociedade esportiva local. Contudo, nos falta registro sobre quem e como foi introduzido o futebol na inóspita Tabocas daquela época.

Com a sonhada independência de Ilhéus, em 1910, os futebolistas começaram a se organizar em times, com a finalidade de comemorar a emancipação político-administrativa. É daí que nasce o União Brazil, em 20 de julho de 1910, disputando jogos na cidade e na região, até a fundação do Guarani Esporte Clube, oficialmente os dois primeiros clubes que se têm notícia em Itabuna.

Se os atletas se rivalizavam nas jogadas em campo, na aparência não era diferente e os uniformes que mais pareciam uma versão dos ternos em tamanho menor, trocando apenas os sapatos por chuteiras e meiões. Se o luxo dos uniformes rivalizava pelo colorido das gravatas, mais, ainda, as arrancadas em direção ao gol adversário. Apesar de “engatinhar”, o futebol já despertava paixão e atraía bons jogadores.

Jogar futebol naqueles tempos era para as pessoas bem mais aquinhoadas, financeiramente, como os comerciantes, compradores de cacau, fazendeiros, advogados e demais profissionais liberais. Mas eram bem-vindos os menos desfavorecidos pela sorte, desde que tivessem habilidade suficiente com a pelota, defendendo, armando jogadas ou atacando. Itabuna soube ser democrata até no futebol, com raríssimas exceções.

Cidade em crescimento, não menos no número de equipes de futebol, e elas rivalizavam nas homenagens aos grandes homens da nossa história, mesmo os que não tinham nenhuma intimidade com a redonda. Datas importantes como 2 de Julho e 7 de Setembro disputavam partidas com Ruy Barbosa, Tiradentes, Castro Alves, Riachuelo e até com a Princesa Isabel. Bons tempos aqueles!

E a prática do esporte bretão na Itabuna em formação cresceu em tamanho e qualidade, chamando a atenção dos times de Ilhéus e seus distritos, bem como despertou paixões nos torcedores itabunenses. A cada contenda fora dos limites, os times eram acompanhados de uma enorme e barulhenta torcida, que não costumava trazer desaforo para casa. A meta era sempre a mesma: vencer e vencer!

Nos escritos do historiador José Dantas de Andrade (Dantinhas) estão atestados que muitos dos times tiveram breve vivência e que os torcedores passaram a engrossar as fileiras das melhores equipes, como a Rio Branco e Ipiranga. Nesses jogos de maior rivalidade, os torcedores costumavam se agrupar em locais diferentes, para mostrar superioridade numérica, costume que se perpetuou.

Porém se o jogo era contra uma equipe adversária de outra cidade, os itabunenses se uniam em torno da equipe local, o que ampliava o confronto dentro e fora de campo. Historicamente, a maior rivalidade era entre as equipes de Itabuna e Ilhéus, que se transformou em uma espécie de guerra particular, com batalhas nas duas cidades. Eram confrontos dentro e fora de campo.

Posteriormente, as torcidas dos times de Ilhéus e Itabuna passaram a ser conhecidas como Papa Caranguejo e Papa Jaca, pela origem marítima e das roças de cacau de cada uma das cidades. Numa dessas batalhas até mesmo um trem foi tomado em Ilhéus para fazer o transporte de volta dos itabunenses. E a história mostra que Itabuna sempre se saiu melhor do que a vizinha praiana.

No início da década de 1930, Itabuna já desfrutava de grandes clubes e importantes jogadores, como o Esporte Clube São José, o Itabuna Futebol Clube e o Clube Atlético Itabunense. Neste ano é fundada a Liga Itabunense de Desportos Atléticos (Lida), com a finalidade de organizar os clubes e o campeonato da cidade. Se já tínhamos times, nos faltava um estádio condizente com a importância de Itabuna.

E com o funcionamento da Lida surgem mais equipes de futebol, a exemplo da Associação Atlética Itabunense, Associação Atlética Janízaros Itabunense, e Grêmio Esportivo Itabunense, este resultante da fusão entre o São José e o América. Em seguida outros clubes como o São Cristóvão, Corinthians e Vasco da Gama, passam a disputar o Campeonato Itabunense de Futebol. Posteriormente, Botafogo, Flamengo, Fluminense, Corinthians, Bahia e Itabuna.

Essa é uma demonstração da paixão do itabunense pelo futebol, que continuou por anos a fio, fazendo história com suas aguerridas equipes amadoras e profissionais, além de inúmeros títulos conquistados. Desde os primórdios da fundação da Vila de Tabocas, o futebol corria nas veias dos itabunenses e se perpetuou até os dias atuais, formando craques que tantas alegrias proporcionaram aos seus torcedores.

*Radialista, jornalista e advogado

sábado, 18 de novembro de 2023

O BERIMBAU – VALHACOUTO DE BOÊMIOS - A Cronica de Walmir Rosário

 

O BERIMBAU – VALHACOUTO DE BOÊMIOS

A capa mostra o cotidiano da Confraria

Desde a manhã desta quarta-feira (15) está disponível no site da Amazon mais um livro de autoria de Walmir Rosário: “O Berimbau, Valhacouto de Boêmios – como a Confraria d’O Berimbau criou e manteve por anos o Troféu Galeota de Ouro”. Inicialmente, o livro foi editado no formato e-Book e pode ser consultado pelos leitores e apreciadores deste tipo de obra por meio do link https://bit.ly/47fFSAi no site da Amazon.

No entender do Autor, pelo mundo afora pode se verificar, in loco, ou simplesmente por ouvir dizer, que cada um dos botecos tem sua especificidade. É como se fosse um DNA, com as diferenças um do outro, o que agrega tipos diferentes de frequentadores. Com isso não quero dizer que um boêmio não possa frequentar vários botecos, pois pode se identificar com os colegas de mesa e copo de vários deles.

Mas o que Walmir Rosário quer dizer é que O Berimbau, em Canavieiras, é diferente, melhor dizendo, sui generis, por arrebanhar uma “fauna” bastante parecida nos hábitos da boemia, apreciadores dos mesmos gostos, sabores e comportamentos. Muitos que chegaram depois se ajustaram e passaram a ser mais um deles, sem tirar nem pôr, como diz o ditado popular.

Mais que um simples boteco, essa plêiade de boêmios fundaram uma confraria com o pomposo nome de Confraria d’O Berimbau. Como todo o boteco que se preza, o Berimbau sempre foi marcado por sua simplicidade, do jeitão de Neném de Argemiro, o líder de um poderoso e heterogêneo grupo, que se igualavam assim que adentravam o ambiente. Não sei se pelo nível do bate-papo, das cachaças com folhas, dos tira-gostos. O livro tem a apresentação de Raimundo Tedesco, um dos fundadores da Confraria d’O Berimbau e do Troféu Galeota de Ouro.

Em cada mudança de sede, os frequentadores seguiam fielmente Neném de Argemiro, e não era apenas pelo som do trompete tocado por Neném. Também eram marca da confraria o sino, com diferentes toques para recepcionar os recém-chegados: longo e intermitente para os mais chegados; mais ou menos para os toleráveis; e um toque breve, este como um aviso que não era da turma.

Outra marca de O Berimbau, que se perpetuou foi o(a) mal(a)assado(a), servido aos confrades aos primeiros sábados de cada mês. Os sábados seguintes eram destinados à gastronomia de sustança, levadas pelos confrades. Mocofato, viúvas de ovinos e caprinos, rabada bovina, sobe-e-desce, galináceos nas mais diversas feituras e até churrascos assados na hora pelos próprios confrades.

Todos os pratos eram antecedidos de tira-gostos dos mais exóticos, como marias-moles, pipocas doces e salgadas e coisas do gênero, levadas por Tyrone Perrucho, um dos fundadores da Confraria d’O Berimbau e do Troféu Galeota de Ouro, junto com os confrades Messias, Turrão, Tolé, Tedesco, Juca Seara, Zé do Gás, e tantos outros, incluindo, aí, Neném de Argemiro.

E a criação do Troféu Galeota de Ouro se deu principalmente por dois motivos: O primeiro, exclusivamente festivo, no qual sobressaíssem atos de euforia, causados pelo excesso de bebidas, desregramento e libertinagem; o segundo, para continuar ao lado de Neném de Argemiro, dono do boteco e personagem inspirador. O evento era realizado no primeiro domingo de dezembro, abrindo o verão canavieirense.

Com o passar dos anos, o Troféu Galeota de Ouro foi acabado pelos confrades, após rusgas entre alguns derivadas da política partidária. Se o evento foi extinto, a confraria continuou mais forte que nunca. Tempos depois, Neném de Argemiro resolve dar adeus aos confrades e se muda para o oriente eterno, decretando, também, a morte da Confraria d’O Berimbau.

Anos se passaram até que Tyrone Perrucho consegue convencer Zé do Gás, genro de Neném de Argemiro e fundador da confraria, para que promovesse a ressurreição d’O Berimbau e a famosa Confraria. E em 13 de dezembro de 2014 eis que O Berimbau abre sua porta aos confrades ainda nesta terra, a outros que desprezaram o hábito da bebida e a novos iniciados.

Seis anos se passaram com a realização das assembleias de sábado da Confraria d’O Berimbau, com comes e bebes regando os animados bate-papo dos confrades, como nos velhos tempos. Mas como diz a sabedoria popular que tudo que é bom dura pouco, chega entre nós a pandemia da Covid-19 e muda os hábitos da população, incluída, aí, os confrades, que até hoje se encontram sem um abrigo da qualidade d’O Berimbau.

O Autor sugere que passem os olhos nas crônicas sobre os usos e costumes dos membros da Confraria d’O Berimbau, pois, quem, sabe, você poderá se identificar como um deles. Confira na leitura se o seu DNA não é o mesmo desses boêmios que tiveram O Berimbau como valhacouto.

Além de “O Berimbau, Valhacouto de Boêmios”, a Amazon disponibiliza outros livros de Walmir Rosário no formato eBook, a exemplo de “Os grandes craques que vi jogar”; “Crônicas de Boteco”; e “Como Sobreviver à Pandemia”.

quarta-feira, 15 de novembro de 2023

ITABUNA PERDE O PROFESSOR EDMUNDO DOURADO

 

ITABUNA PERDE O PROFESSOR EDMUNDO DOURADO

O professor Edmundo Dourado em evendo católico

 Por Walmir Rosário*

Quando ouço alguém dizer que toda a unanimidade é burra, imediatamente penso que ele não conhece ou ouviu falar do professor Edmundo Dourado da Silveira, um dos maiores itabunenses nascido em Umbaúba, Sergipe. E nesta terça-feira, 14 de novembro de 2023, o itabunense chora a perda desse homem que sempre esteve presente na vida de Itabuna, desde o início dos anos 1960.

E a notícia me pegou de surpresa, aqui em Santa Catarina, onde me encontro, mesmo sabedor das dificuldades com a saúde do ilustre professor Dourado, do alto dos seus 86 anos. Foi professor de três dos meus filhos, que sempre engrandecem o mestre pelo que aprenderam, assim como cerca de outros 40 mil alunos que tiveram a graça de tê-lo com professor.

Sempre gozou de reconhecida competência para ensinar as matérias que quisesse, porém era consagrado como grande expoente em matemática e filosofia. Sabia repassar o conhecimento sem firulas (não condeno os que fazem), mas ele transmitia a árida matemática sem esforço, com poucas palavras até, porém as exatas como a ciência a qual pertence.

Em filosofia era completo e deixava qualquer plateia atenta aos seus ensinamentos quando a matéria era a Lógica. Não meço as palavras e nem me acho esdrúxulo em dizer que o professor Edmundo Dourado fez história na educação pelo seu conhecimento, mas, sobretudo pelo método didático preciso, transmitindo sabedoria para alunos de todas as idades.

Desde que chegou a Itabuna lecionou em praticamente todos os colégios, a começar pelo antigo Ginásio, hoje Fundamental II, o Ensino Médio foi fundador das Faculdades de Filosofia de Itabuna (FAFI) e Faculdade de Ciências Econômicas de Itabuna (FACEI), que integraram Federação das Escolas Superiores de Ilhéus e Itabuna (FESPI), a atual Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC).

Fundou colégios com padrão de excelência, e por isso bastante concorridos pela sociedade itabunense. Mas sua contribuição à educação de Itabuna também se fez por sua passagem na Câmara Municipal de Itabuna, da qual foi presidente e um dos responsáveis pela condução da Lei Orgânica do Município. Como político, era visto pelos seus pares como um vereador acima das questões meramente partidária.

Sua aptidão pela educação foi reconhecida desde que ainda o menino pobre deixou Umbaúba, sua cidade natal, para estudar em Maceió, sendo aprovado no temido Exame de Admissão ao Ginásio, com notas 10 em todas as matérias. Daí, passou para exercer o magistério (?) ensinando seus próprios colegas em troca de merenda e outras benesses, como gostava de contar.

Militar do Exército, deixou Recife ao ser transferido para Ilhéus, e chamou a atenção do então Major Dória e do Tenente Everaldo Cardoso, que o trouxeram para Itabuna, cidade na qual se destacou, como militar, professor, político e cidadão. Homem de hábitos simples, pouca conversa, ouvia muito mais do que falava. Ao tomar suas decisões as apresentava como certeiras, abalizadas, concisas e equilibradas.

Tive o privilégio de conviver com o professor e vereador Edmundo Dourado quando de meu retorno a Itabuna, em meados dos anos 80, ele vereador e eu jornalista, inclusive com o cargo de Assessor de Comunicação da Prefeitura de Itabuna. Depois também convivemos no Legislativo, no qual as questiúnculas políticas partidárias passavam ao largo, pelo respeito que ostentava junto aos seus pares.

Fora da política, o cidadão Edmundo Dourado era a primeira pessoa a ser lembrada para ocupar cargos de direção em entidades da sociedade civil organizada, a exemplo do Grupo de Ação Comunitária, pela sua sabedoria, respeito e equilíbrio. Mesmo com a saúde abalada, nunca deixou de “chegar junto” nas questões de Itabuna e era meu conselheiro quando eu exercia o cargo de secretário municipal de Ações Governamentais e Comunicação Social.

Edmundo Dourado da Silveira é daquelas pessoas que estão acima do bem e do mal em qualquer sociedade, não por vontade própria, mas pela sua contribuição, daí o reconhecimento público. Sabemos que era homem de “carne e osso” por se assemelhar a nós e ser o patriarca de uma família composta pela sua esposa Maria Lúcia e quatro filhos.

*Radialista, jornalista e advogado.

quinta-feira, 9 de novembro de 2023

OS EXCELENTES GOLEIROS DE ITABUNA

 

OS EXCELENTES GOLEIROS DE ITABUNA

Plínio Assis jogou no Flamengo e na Seleção

Por Walmir Rosário*

Recentemente recebi do colega radialista e advogado Geraldo Santos Borges, uma mensagem por WhatsApp me incentivando a mostrar os bons goleiros que passaram por Itabuna, desde os amadores até os profissionais. E mais, o Jurista, como nos tratamos, ainda catalogou bons nomes e informações dos que fizeram a alegria dos itabunenses, em seus clubes ou na brilhante Seleção de Itabuna amadora.

E como não poderia deixar de ser, Carlito, colega nosso de Ceplac, encabeça a lista. Em 4 de abril de 1957, titular da Seleção de Itabuna no Torneio Antônio Balbino, foi um dos responsáveis diretos pela conquista do título. À época, na disputa por pênaltis, que eram batidos por um só jogador. E nessa final foram cobradas três séries de cinco penalidades, cada. Pela Seleção de Itabuna Santinho marca todos os 15 e Carlito defende um. Classificada para a final contra Alagoinhas, Itabuna vence por 2X0 e é Campeã.

Esse mesmo selecionado, no segundo semestre, se sagra vencedor do Campeonato Intermunicipal Baiano de Amadores, desta vez com o goleiro Asclepíades (se revezava com Carlito). E Geraldo Borges ressalta que além de defender, Asclepíades era um excelente batedor de pênaltis, o que fazia com frequência no Flamengo, time em que jogava. E ele era o terror dos atacantes nas cobranças de escanteio contra o time que defendia, pois saia do gol pra socar a bola ou algum atacante que se descuidasse na tentativa de cabecear para o gol.

Outro merecedor de destaque é Plinio Assis, também do Flamengo. Tranquilo, frio, extraordinário. Diziam que o time era Plinio e mais dez. Na seleção de Itabuna, em um jogo na desportiva contra a seleção de São Felix, a bola já havia passado e ele a tirou com o calcanhar. Fatalmente entraria. Após o jogo, o narrador Geraldo chama de lance de pura sorte. Plínio ficou possesso e ressaltou que fez a defesa de forma consciente.

E tudo indica que foi mesmo. De outra feita, conta o Vasco da Gama, no campo da Desportiva, Delém chuta a bola na marca do pênalti e Plínio parte para a jogada, a bola bate no seu peito e não entra. Contra a seleção de Muritiba, o atacante cabeceia, Plínio foi vencido e levanta seu calcanhar como último recurso, conseguindo evitar o gol. E Geraldo Borges arremata: “Que Higuita que nada”, ao ver o goleiro da Colômbia fazer malabarismos e artes deste tipo, até em jogos de Copa do Mundo. Plínio já fazia antes.

Luiz Carlos foi outro goleiro inesquecível. Fechava o gol. Era uma segurança. Alto, esguio, elegante, preciso, seguro. Se ele não tivesse sido jogador antes de Leão – do Palmeiras e da Seleção Brasileira –, certamente não faltaria quem dissesse que ele imitava o Leão. Até o gesto que fazia quando a bola ia pra fora era semelhante ao do goleiro Leão. Luiz Carlos e Plínio se revezavam na Seleção de Itabuna.

– E o Betinho? Este tem uma história difícil de acreditar para quem não viveu àquela época – lembra Geraldo.

E Geraldo Borges continua: “Já ouviram falar em alguém que acertou na loteria e rasgou o bilhete? Pois foi quase isso que aconteceu com Betinho. Trazido a Itabuna para jogar no Janízaros de Gerson Souza, se superava a cada partida. Alto, bom porte, ‘como um gato’ (diria Tadeu Schimidt) pegava tudo e mais alguma coisa”.

O Santos – então melhor time do mundo – veio jogar um amistoso em Ilhéus, trazendo Pelé e o time completo. “Os ilheenses buscaram Betinho para jogar na seleção de Ilhéus que seria a equipe adversária do Santos. Betinho, fechou o gol. Pegou tudo. Mesmo assim o Santos ganhou pelo placar de 3X1.

Durante a partida, o ponta-esquerda Pepe, conhecido pelo chute forte como o canhão da Vila Belmiro, era o cobrador de faltas do Santos. Chovia, campo molhado, bola pesada. Falta na intermediária de Ilhéus e Betinho desafia Pepe, mandando abrir a barreira. Pepe cobra forte, como sempre. E Betinho segura e cai com a bola. A mão ficou em frangalhos, mas a bola não passou e ele continuou no jogo como se nada tivesse acontecido.

Reza a lenda que Pelé correu pra área, suspendeu Betinho puxando pela camisa e teria dito: “Levanta goleirão, vou lhe levar pro Santos!”. Betinho foi. Mas não ficou. Com saudades dos amigos e das farras itabunenses, pegou um ônibus e voltou pra Itabuna. De nada adiantou as recomendações de Claudio, então titular no gol do Santos. “Calma baiano, você vai jogar no gol do melhor time do mundo!...”.

Daqui de Itabuna o Betinho foi para o Vitória. E segundo me disseram, morreu em Jequié, sua terra, trabalhando como carregador de caminhão – uma pena!... Ressalta o escritor esportivo Tasso Castro, que nunca viu um goleiro segurar (sem encaixar) chutes fortes de fora da área como Betinho. Ele era diferente.

– Sua colocação e segurança eram impressionantes. Parecia que a bola o procurava. Tinha poucos defeitos como nos cruzamentos para área, por exemplo. Vi um jogo do Itabuna contra o Bahia no estádio da Graça.  No empate de 1 x 1, que deu o título do segundo turno ao Itabuna, ele fechou o gol. Eu estava lá –, comenta Tasso Castro.

Também passaram outros bons goleiros por Itabuna, a exemplo de Ivanildo, do Fluminense, que tinha bastante colocação e segurança ao disputar as bolas na área. Pelo Itabuna Esporte Clube também jogaram grandes goleiros, como Geraldo (do Rio de Janeiro), que morreu afogado no rio Cachoeira, próximo ao Salobrinho; Zé Lourinho, Laércio e Getúlio, cada um deles dando conta do recado.

*Radialista, jornalista e advogado

quinta-feira, 2 de novembro de 2023

QUASE EMBARCO NUMA CANOA FURADA EM PARATY - Por Walmir Rosário, direto de Canavieiras

 

QUASE EMBARCO NUMA CANOA FURADA EM PARATY

À direita o Mário, e à esquerda em frente, o Patati Patatá

 Por Walmir Rosário*

Assim que passou o Carnaval do ano da graça de 1973 aporto – mesmo por via terrestre – na cidade de Paraty. Viagem a trabalho, para implantar uma frente de obras na BR-101, no trecho conhecido como Rio-Santos. Muitas imaginações passavam pela minha cabeça, a exemplo de conhecer a cidade histórica cujo nome se transformou em sinônimo de cachaça.

Por outro lado, as notícias que eu tinha sobre a cidade não eram tão tranquilas para os que iriam a trabalho, por ter um custo de vida altíssimo, pois há anos vivia do turismo. Os que iam a passeio pouco se importavam com os custos de hotel e restaurantes. O que importava, mesmo, eram bater suas fotos na cidade histórica, ao lado dos antigos e bem conservados casarões e praias.

Porém Paraty não era apenas uma cidade dos turistas bem aquinhoados pela sorte nas finanças. Pra lá também seguiam – e ficavam por um bom tempo – os hippies de todos os matizes, desde os originários de famílias abastadas ou os chamados pés-rapados. Se viravam como podiam e se drogavam à vontade, sem qualquer repressão. Pra eles, era o paraíso!

Pois bem, assim que consegui me hospedar com todo o pessoal no Hotel Bela Vista, perguntei ao proprietário, Silas Coupê, onde experimentaria uma boa cachaça de Paraty e uns bons tira-gostos. Me indicou um barzinho (pequeno mesmo) próximo e de nome muito sugestivo: Patati Patatá. E pra lá rumei na intenção de começar bem o primeiro sábado em Paraty.

Para minha surpresa, o barzinho lotado, gente espalhada pelas calçadas. De cara, disse pra mim mesmo: Cheguei ao lugar certo para espraiar as ideias e conhecer bem a cidade e sua gente. Pedi ao dono do Patati Patatá, Luiz Papa, um paulista que trocou a pauliceia desvairada por Paraty, a melhor cachaça e tira-gosto especialidade da casa.

Enquanto vou me familiarizando no ambiente, observo uma mesa barulhenta e uma voz por demais conhecida, que aos poucos identifiquei como sendo o cantor e compositor Tim Maia. Junto a ele, uma “fauna” ligada à música, inclusive o compositor Cassiano e demais ilustres desconhecidos para mim, baiano recém-chegado.

Aos poucos fui conhecendo as pessoas, pouquíssimos paratienses, muitos paulistas, uns argentinos e uruguaios. Na grande maioria, hippies e frequentadores assíduos da cidade, alguns com casas de veraneio. Confesso que fiquei um pouco assustado, mas gostei do ambiente, pelos produtos, serviço e clientes. Guardadas as devidas proporções, a lembrança me remeteu ao Bar Caninha, na Federação, em Salvador.

Assim que a fome apertou, me informo com Luiz Papa onde poderia almoçar uma comida de sustança, se é que por ali serviria. Sem pestanejar, Luiz me indica: “Olha, logo aqui ao lado esquerdo, vizinho à Telesp, tem um seu conterrâneo, o Mário, que prepara tudo o que você quer comer, como mocotó, rabada, feijoada e essas comidas da Bahia”.

Não perdi tempo pois não poderia deixar essas delícias à espera, ainda mais depois de experimentar a boa cachaça paratiense calçando umas cervejas bem geladas. Me apresento ao conterrâneo como um baiano recomendado por Luiz Papa. Após apertos de mãos e saudações de bem-vindo, me sento, bebo mais uma cachaça, uma cerveja e mergulho nos pratos de sustança.

Devidamente saciado e novamente pronto para qualquer eventualidade, minha intenção era dar mais uma passadinha no Patati Patatá, agradecer pela indicação e retomar o bate-papo. Assim que chego à calçada vejo um ônibus da Colitur estacionado em frente ao barzinho, pessoas do outro lado da rua olhando e alguns policiais organizando uma fila.

Ao chegar mais perto me dei conta que todos os clientes, (ao que me pareceu) estavam sendo colocados no interior do ônibus. De cara avistei entre eles, Tim Maia e sua turma. Sigo para a calçada em frente em busca de informações e fiquei sabendo que a polícia pretendia se livrar daquela galera, por motivos óbvios: perturbação do sossego e mais alguns artigos do Código Penal.

Passei a me sentir protegido por meu anjo de guarda e meu estômago, que me fizeram ausentar – momentaneamente – do Patati Patatá e me safar de um conflito em que não teria qualquer culpa no cartório. Na saída, os policiais deram ordens ao motorista do coletivo que só parasse no distrito da Ponte Branca, a 6 quilômetros, e que eles não se atrevessem a retornar.

Na sequência, Luiz Papa fecha o Patati Patatá, abre o restaurante Palhoça, do qual continuei seu cliente de todas as noites – depois com Toninho Pinto. E esse baiano se aclimatou bem em Paraty, tanto que por lá construiu amigos, se casou com uma paratiense, por lá morou muitos anos e ainda costuma frequentar a cidade.

Poucos conhecem minha passagem nessa história, agora revelada e já de conhecimento público.

*Radialista, jornalista e advogado

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