alhos & bugalhos
Nada mais do que polemicas
Encarregado de preencher as “fichas” da Academia de Letras de
Ilhéus criada em 1958, o seu primeiro secretário, jovem advogado Francolino
Neto, aguardou quatro anos para, pessoalmente, colher os dados do acadêmico
Jorge Amado. De caneta em punho e após preencher o nome, endereço e
filiação do romancista, à época já famoso, fez a pergunta: “Local de
nascimento?”. “Pergunte ao meu pai…” - se esquivou Jorge Amado. Na sua
carteira de identidade constava a cidade de Itabuna como local
do nascimento, mas no fundo ele sabia que havia uma polêmica tanto
familiar como “de ordem pública”. Francolino Neto não se fez de rogado
e foi até Itajuípe para se encontrar com o fazendeiro João Amado,
pai do escritor. O Coronel João não vinha a Ilhéus há muito tempo, pois
tinha pavor a vergalho de boi… Diziam as más línguas que o coronel se
engraçou com uma mulher casada e acabou tomando uma surra de vergalho de boi.
Mas voltemos ao encontro de Dr. Francolino com o Coronel João Amado.
Encontraram-se na firma compradora de cacau Wildberg & Cia. e o
secretário da Academia foi direto ao assunto. O Coronel João Amado
disse então a Francolino: “Jorge nasceu na Fazenda Auricídia que ficava na
zona do Repartimento no limite entre os municípios de Itabuna e
Itajuípe.”
A maior
parte da fazenda pertencia em 1912, ano do nascimento de Jorge, a Itabuna,
antiga Tabocas que em 1910 tinha se emancipado de Ilhéus. Mais precisamente
no distrito de Ferradas, na época próspero entroncamento de tropeiros. A
outra parte da fazenda pertencia ao 7º Distrito de Ilhéus, denominado de
Pirangí, mais tarde emancipado e que originou o município de Itajuípe. Dr.
Francolino, rápido no raciocínio fez então a pergunta fatal. “E de que
lado ficava a sede da fazenda?” João Amado não titubeou: “Ficava em Pirangí”.
Francolino deu uma risadinha marota e tascou na “ficha” de Jorge Amado –
Local de Nascimento: Ilhéus, Bahia, Brasil. A Lei 807 de 28 de julho de 1910,
que criou o município de Itabuna, sancionada pelo então governador Araújo
Pinho, não era muito precisa nas indicações dos limites territoriais,
principalmente quando não existiam rios ou ribeirões para delimitação com
maior precisão.
Naquela
ocasião a linha demarcatória “seca” como era chamada, causava muitos
desencontros, e até mesmo nos limites de Ilhéus, o município mãe, com
Itabuna, as dúvidas persistiram. Na Fazenda Auricídia passava um ribeirão
denominado de Limoeiro, mas segundo as informações ele não servia de limite
territorial. Em 1952, portanto 40 anos após o nascimento de Jorge Amado, o
Distrito de Pirangí foi desmembrado de Ilhéus, passando a denominar-se de
Itajuípe e em seu território foi criado o Distrito de Limoeiro, onde ficava a
zona do Repartimento. Região de terras nobres para o cultivo do cacau,
Limoeiro logo se expandiu e em 1962 de desmembrou de Itajuípe sob a
denominação de Barro Preto. Hoje, Barro Preto de chama “Governador Lomanto
Júnior”, nome por sinal de péssimo gosto, sem querer entrar no mérito dos
méritos do homenageado. A sede da Fazenda Auricídia situava-se,
portanto, em território que hoje pertence ao município de Lomanto
Júnior.
Como se pode
verificar, a polêmica está armada. Na Certidão de Nascimento de Jorge Amado
consta que ele é itabunense. O velho João Amado disse que ele nasceu
em Pirangí, que então pertencia a Ilhéus. As emancipações
posteriores colocaram a sede da Fazenda Auricídia no território de Barro
Preto, hoje Lomanto Júnior. Itabuna, Ferradas, Ilhéus, Pirangí, Itajuípe,
Limoeiro, Barro Preto e Governador Lomanto Júnior. Cidades, distritos,
vilas, denominações velhas e novas. Jorge Amado lá de cima deve estar
dando grandes gargalhadas. De minha parte, quando vereador, resolvi propor o
título de Cidadão Ilheense ao nosso escritor. Quem registra é dono, e Itabuna
registrou Jorge Amado, mas nós, ilheenses, estamos na posse mansa e pacífica,
que às vezes vale mais do que papel registrado em cartório. Mas de
certo não é necessária tanta polêmica. Jorge não é itabunense, nem
ilheense, nem itajuipense e nem lomantense (?). Jorge é grapiúna e Cidadão do
Mundo.
Artigo
publicado originalmente em março de 2003 nos jornais Agora e Diário de
Ilhéus. Contato com o autor ialbagli@uol.com.br
|
Por
Hoje é Só. Vou bater o Martelo.
Ponto Final. Redação “O Bolso do Alfaiate”
|
quarta-feira, 23 de maio de 2012
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