terça-feira, 22 de novembro de 2011


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Reflitam os pensamentos e texto abaixo

DE MAIAKOVSKI A CLAUDIO HUMBERTO
Lucy Reichenbach
 Tenho recebido mails,  este último há menos de duas horas, de um querido amigo português, contendo um alerta contra a indiferença e onde são invocados  primeiramente o grande poeta russo Maiakovski (1893-1930), neste belo poema:

Na primeira noite, eles se aproximam
e colhem uma flor de nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem,
pisam as flores, matam nosso cão.
E não dizemos nada.
Até que um dia, o mais frágil deles,
entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a lua,  e, conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E porque não dissemos nada,
já não podemos dizer nada.

 Depois são lembradas as palavras de Bertold Brecht (1898-1956):

Primeiro levaram os negros
Mas não me importei com isso
Eu não era negro
Em seguida levaram alguns operários
Mas não me importei com isso
Eu também não era operário
Depois prenderam os miseráveis
Mas não me importei com isso
Porque eu não sou miserável
Depois agarraram uns desempregados
Mas como tenho meu emprego
Também não me importei
Agora estão me levando
Mas já é tarde.
Como eu não me importei com ninguém
Ninguém se importa comigo.

Por fim, Martin Niemöller anti-nazista que teria dito com outras palavras algo igual por volta de 1933:

 Um dia vieram e levaram meu vizinho que era judeu.
Como não sou judeu, não me incomodei.
No dia seguinte, vieram e levaram
Meu outro vizinho que era comunista.
Como não sou comunista, não me incomodei .
No terceiro dia vieram
e levaram meu vizinho católico.
Como não sou católico, não me incomodei.
No quarto dia, vieram e me levaram;
já não havia mais ninguém para reclamar...

 Até chegar no meu diariamente lido Claudio Humberto em 2007:

Primeiro eles roubaram nos sinais, mas não fui eu a vítima,
Depois incendiaram os ônibus, mas eu não estava neles;
Depois fecharam ruas, onde não moro;
Fecharam então o portão da favela, que não habito;
Em seguida arrastaram até a morte uma criança, que não era meu filho...

 Essa preocupação me faz pensar que talvez haja uma saída para o ser humano e que finalmente, pela dor,  as pessoas começem a entender que sem luta não há liberdade e sem liberdade não há direito! 
O conteúdo desses mails não trazem novidade1  e, tenho para mim, que quem realmente plantou essa idéia, que tenho pregado ao longo de minha vida profissional, foi o grande jurisconsulto Rudolf Von Ihering, nascido em 1868 numa pequena cidade alemã. 
Destacou-se pela aguda inteligência e foi um dos maiores juristas que o mundo conheceu. Em “ A Luta pelo Direito”2   a sua pregação, em apertado resumo, era a de que não importa se seu direito vale um centavo ou um milhão, deve lutar por ele para que não só o seu direito se realize, mas para que ele se afirme perante o meio social como algo a ser respeitado. Em outras palavras, só o exercício do direito – portanto, a luta – o afirma e fortalece.
 Pois bem.  Ihering já falava a mesma coisa, aplicada ao direito, muito antes de Maiakovski ou Bertold Brecht. Isto porque é sendo infiel no pouco que acabamos infiéis no muito. É sendo indiferentes nas pequenas coisas que somos vítimas de grandes tragédias.
 Se deixamos que o outro entre em nossa vida e a manipule, hoje dando ordens ao jardineiro, amanhã aos seus filhos, no momento imediato irá dirigir sua vida, dizendo com quem deves falar, a quem deves ou não deves amar e até mesmo o que deves fazer com os bens que tens.   Enfim, um pouco de distração e já não tens a tua liberdade! 
Hoje está em voga a impunidade para os tais delitos denominados de “bagatela”,  abrindo-se um flanco para o desrespeito à lei. Delito é delito, não há no ilícito qualquer bagatela.  Mais que um bem juridicamente tutelado, foi desrespeitado um princípio,  aquele que manda que cada um respeite as coisas alheias.
 A frouxidão moral é como um elástico que o inimigo vai esticando, esticando, até que ricocheteie na tua cara!
 Aqui em minha casa tivemos uma experiência parecida, fomos deixando que determinada pessoa tomasse conta de nossas coisas e de nossas vidas e a tal ponto, que a certa altura achou-se no direito de fazer escolhas em nosso lugar e chegou mesmo a se indignar porque um determinado computador tinha senha. Como nos atrevíamos a lhe obstar o acesso? 
Pois é exatamente assim que as coisas acontecem, o que antes era uma liberalidade passa a ser uma exigência,  o que antes era afável passa a ser abusado e atrevido.  Guardadas as proporções, o efeito dessa passividade é igualmente devastador numa comunidade ou num país.
 Por isto, sempre defendi e continuarei a defender que o seu direito, valha ele um centavo ou um milhão, deve ser exercido, defendido, desfraldado, porque da sua afirmação depende a existência do respeito ao direito de todos!
A indiferença, prima-irmã da passividade e da distração, é a causa, repito  de todas as grandes tragédias humanas, desde o stalinismo, nazismo, racismo até a criminalidade carioca.
A segurança pública no Brasil vem sendo tratada com essa mesma leviandade e indiferença, seja subestimando a capacidade e a crueldade da marginalidade, seja tratando o nosso exército como uma legião de genis3, que logo após serem usadas são boas de cuspir.
 Os americanos, quando em guerra, além de fornecer todos os meios necessários até enviam artistas para levantar o moral da tropa. Aqui no Brasil, não.   Nosso exército está no front levando pedradas pelas costas. Se um policial matar um bandido num confronto é crucificado na imprensa e acusado de executor. O Conselho de Direitos humanos visita a familia do malfeitor e oferece advogado gratuito para acionar danos morais do Estado.
 Quando um policial morre não aparece ninguém. O front está esvaziando e a tropa de moral baixa. O resultado está aí e pode ser tarde:  o inimigo já bate à nossa porta!
________________________
[1] “Quando a casa do vizinho pega fogo é a tua que começa a arder”
[2] Der Kampf ums Recht
[3]  Joga pedra da geni, joga bosta na geni.... de Chico Buarque de Holanda: Geni e o Zepellin

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